domingo, 17 de fevereiro de 2013

NOVAS COMPETÊNCIAS PARA ENSINAR




ORGANIZAR E DIRIGIR SITUAÇÕES DE APRENDIZAGEM

Por que apresentar como uma nova competência a capacidade de organizar e de dirigir situações de aprendizagem? Ela não estaria no próprio cerne do ofício de professor?
Tudo depende, evidentemente, do que se esconde sob as palavras. O ofício de professor foi, por muito tempo, assimilado à aula magistral seguida de exercícios. A figura do Magister lembra aquela de Discípulo, que "bebe suas palavras" e nunca pára de se formar em contato com ele, elaborando posteriormente seu pensamento. Escutar uma lição, fazer exercícios ou estudar em um livro podem ser atividades de aprendizagem. Conseqüentemente, o professor mais tradicional pode pretender organizar e dirigir tais situações, mais ou menos como M. Jourdin fazia prosa, sem saber, ou mais exatamente, sem dar importância a isso. A própria idéia de situação de aprendizagem não apresenta nenhum interesse para aqueles que pensam que se vai à escola para aprender e que todas as situações servem supostamente a esse desígnio. Desse ponto de vista, insistir nas "situações de aprendizagem" nada acrescenta à visão clássica do ofício de professor. Essa insistênda pode até mesmo parecer pedante, como se insistíssemos em dizer que um médico "concebe e dirige situações terapêuticas" mais do que simplesmente reconhecer que trata seus pacientes, assim como o mestre instrui seus alunos. Com exceção daqueles que estão familiarizados com as pedagogias ativas e com os trabalhos em didática das disciplinas, os professores de hoje não se concebem espontaneamente como "conceptores-dirigentes de situações de aprendizagem".
Trata-se de uma simples questão de vocabulário, ou eles têm razões para resistir a uma maneira de ver que só pode complicar sua vida? Tomemos o exemplo do ensino universitário de primeiro ciclo, tal como ainda dispensado na maioria dos países. A aula é dada em um anfiteatro, diante de centenas de rostos anônimos. Compreenda e aprenda quem puder! O professor poderia por um instante alimentar a ilusão de que cria, desse modo, para cada um, uma situação de aprendizagem, definida pela escuta da palestra magistral e pelo trabalho de tomada de notas, de compreensão e de reflexão que ela supostamente suscita. Se ele refletir, verá que a padronização aparente da situação é uma ficção e que existem tantas situações diferentes quantos alunos. Cada um vivencia a aula em função de seu humor e de sua disponibilidade, do que ouve e compreende, conforme seus recursos intelectuais, sua capacidade de concentração, o que o interessa, faz sentido para ele, relaciona-se com outros saberes ou com realidades que lhe são familiares ou que consegue imaginar. Nesse estágio da reflexão, o professor terá a sabedoria de suspendê-la, sob pena de avaliar que, na verdade, não sabe grande coisa a respeito das situações de aprendizagem que cria... Ver-se como conceptor e dirigente de situações de aprendizagem não deixa de ter riscos: isso pode levar ao questionamento de sua pertinência e eficácia.
O sistema educativo construiu-se de cima para baixo. É por isso que as mesmas constatações valem, até um certo ponto, para o ensino médio e, em menor medida, para o ensino fundamental. Quando os alunos são crianças ou adolescentes, eles são menos numerosos e o ensino é mais interativo; há mais possibilidades de exercícios e experiências feitas por eles (e não diante deles). Entretanto, enquanto praticarem uma pedagogia magistral e pouco diferenciada, os professores não dominarão verdadeiramente as situações de aprendizagem nas quais colocam cada um de seus alunos. No máximo, podem velar, usando meios disciplinares clássicos, para que todos os alunos escutem com atenção e envolvam-se ativamente, pelo menos em aparência, nas tarefas atribuídas. A reflexão sobre as situações didáticas começa com a questão de Saint-Onge (1996): "Eu, ensino, mas eles aprendem?".
Desde Bourdieu (1966), sabe-se que só aprendem verdadeiramente, por meio dessa pedagogia, os "herdeiros", aqueles que dispõem dos meios culturais para tirar proveito de uma formação que se dirige formalmente a todos, na ilusão da eqüidade, identificada nesse caso pela igualdade de tratamento. Isso parece evidente hoje em dia. No entanto, foi necessário um século de escolaridade obrigatória para se começar a questionar esse modelo, opondo-lhe um modelo mais centrado nos aprendizes, suas representações, sua atividade, as situações concretas nas quais são mergulhados e seus efeitos didáticos. Sem dúvida, essa evolução — inacabada e frágil — tem vínculos com a abertura dos estudos longos a novos públicos, o que obriga a se preocupar com aqueles para os quais assistir a uma aula magistral e fazer exercícios não é suficiente para aprender. Há laços estreitos entre a pedagogia diferenciada e a reflexão sobre as situações de aprendizagem (Meirieu, 1989; 1990).
Na perspectiva de uma escola mais eficaz para todos, organizar e dirigir situações de aprendizagem deixou de ser uma maneira ao mesmo tempo banal e complicada de designar o que fazem espontaneamente todos os professores. Essa linguagem acentua a vontade de conceber situações didáticas ótimas, inclusive e principalmente para os alunos que não aprendem ouvindo lições. As situações assim concebidas distanciam-se dos exercícios clássicos, que apenas exigem a operacionalização de um procedimento co­nhecido. Permanecem úteis, mas não são mais o início e o fim do trabalho em aula, como tampouco a aula magistral, limitada a funções precisas (Étienne e Lerouge, 1997, p. 64). Organizar e dirigir situações de aprendizagem é manter um espaço justo para tais procedimentos. É, sobretudo, despender energia e tempo e dispor das competências profissionais necessárias para imaginar e criar outros tipos de situações de aprendizagem, que as didáticas contemporâneas encaram como situações amplas, abertas, carregadas de sentido e de regulação, as quais requerem um método de pesquisa, de identificação e de resolução de problemas.
Essa competência global mobiliza várias competências mais específicas:

. Conhecer, para determinada disciplina, os conteúdos a serem ensinados e sua tradução em objetivos de aprendizagem.
. Trabalhar a partir das representações dos alunos.
. Trabalhar a partir dos erros e dos obstáculos à aprendizagem.
. Construir e planejar dispositivos e seqüências didáticas.
. Envolver os alunos em atividades de pesquisa, em projetos de conhecimento.
Vamos analisá-las, uma a uma, lembrando-nos de que todas contribuem para a concepção, organização e animação de situações de aprendizagem.

CONHECER PARA DETERMINADA DISCIPLINA, OS CONTEÚDOS A SEREM ENSINADOS E SUA TRADUÇÃO EM OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

Conhecer os conteúdos a serem ensinados é a menor das coisas, quando se pretende instruir alguém. Porém, a verdadeira competência pedagógica não está aí; ela consiste, de um lado, em relacionar os conteúdos a objetivos e, de outro, a situações de aprendizagem. Isso não parece necessário, quando o professor se limita a percorrer, capítulo após capítulo, página após página, o "texto do saber". Certamente, nesta etapa há transposição didática (Chevallard, 1991), na medida em que o saber é organizado em lições sucessivas, conforme um plano e em um ritmo que dêem conta, em princípio, do nível médio e das aquisições anteriores dos alunos, com momentos de revisão e de avaliação. Em tal pedagogia, os objetivos são implicitamente definidos pelos conteúdos: trata-se, em suma, de o aluno assimilar o conteúdo e de dar provas dessa assimilação durante uma prova oral, escrita ou um exame.
A preocupação com os objetivos vem à tona durante os anos 60, com a "pedagogia de domínio", tradução aproximada da expressão inglesa mastery learning. Bloom (1979), seu criador, defende um ensino orientado por critérios de domínio, regulado por uma avaliação formativa que leve a "remediações". Na mesma época (Bloom, 1975), propõe a primeira "taxonomia dos objetivos pedagógicos", ou seja, uma classificação completa das aprendizagens visadas na escola.
Nos países francófonos, essa abordagem foi freqüentemente caricaturada sob o rótulo de "pedagogia por objetivos". Hameline (1979) descreveu tanto as virtudes quanto os excessos e os limites do trabalho por objetivos. Huberman (1988) mostrou que o modelo da pedagogia de domínio permanece pertinente, desde que ampliado e integrado a abordagens mais construtivistas. Hoje em dia, ninguém mais pleiteia um ensino guiado a cada passo por objetivos muito precisos, imediatamente testados com vistas a uma remediação imediata. O ensino certamente persegue objetivos, mas não de maneira mecânica e obsessiva. Eles intervêm em três estágios: do planejamento didático, não para ditar situações de aprendizagem próprias a cada objetivo, mas para identificar os objetivos trabalhados nas situações em questão, de modo a escolhê-los e dirigi-los com conhecimento de causa; da análise a posteriori das situações e das atividades, quando se trata de delimitar o que se desenvolveu realmente e de modificar a seqüência das atividades propostas; da avaliação, quando se trata de controlar os conhecimentos adquiridos pelos alunos.
Traduzir o programa em objetivos de aprendizagem e estes em situações e atividades realizáveis não é uma atividade linear, que permita honrar cada objetivo separadamente. Os saberes e o savoir-faire de alto nível são construídos em situações múltiplas, complexas, cada uma delas dizendo respeito a vários objetivos, por vezes em várias disciplinas. Para organizar e dirigir tais situações de aprendizagem, é indispensável que o professor domine os saberes, que esteja mais de uma lição à frente dos alunos e que seja capaz de encontrar o essencial sob múltiplas aparências, em contextos variados.
"O que se concebe bem se enuncia claramente, e as palavras para dizê-lo afloram com facilidade", dizia Boileau. Atualmente, estamos bem além desse preceito. Não basta, para fazer com que se aprenda, estruturar o texto do saber e depois "lê-lo" de modo inteligível e vivaz, ainda que isso já requeira talentos didáticos. A competência requerida hoje em dia é o domínio dos conteúdos com suficiente fluência e distância para construí-Ios em situações abertas e tarefas complexas, aproveitando ocasiões, partindo dos interesses dos alunos, explorando os acontecimentos, em suma, favorecendo a apropriação ativa e a transferência dos saberes, sem passar necessariamente por sua exposição metódica, na ordem prescrita por um sumário.
Essa facilidade na administração das situações e dos conteúdos exige um domínio pessoal não apenas dos saberes, mas também daquilo que Develay (1992) chama de matriz disciplinar, ou seja, os conceitos, as questões e os paradigmas que estruturam os saberes no seio de uma disciplina. Sem esse domínio, a unidade dos saberes está perdida, os detalhes são superestimados e a capacidade de reconstruir um planejamento didático a partir dos alunos e dos acontecimentos encontra-se enfraquecida.
Por isso, a importância de saber identificar noções-núcleo (Meirieu, 1989, 1990) ou competências-chave (Perrenoud, 1998a) em torno das quais organizar as aprendizagens e em função das quais orientar o trabalho em aula e estabelecer prioridades. Não é razoável pedir a cada professor que faça sozinho, para sua turma, uma leitura dos programas com vistas a extrair núcleos. Entretanto, mesmo que a instituição proponha uma reescritura dos programas nesse sentido, eles correm o risco de permanecer letra morta para os professores que não estão prontos para consentirem um importante trabalho de vaivém entre os conteúdos, os objetivos e as situações. É esse preço que pagarão para navegar na cadeia da transposição didática "como peixes na água"!

TRABALHAR A PARTIR DAS REPRESENTAÇÕES DOS ALUNOS

A escola não constrói a partir do zero, nem o aprendiz não é uma tábula rasa, uma mente vazia; ele sabe, ao contrário, "muitas coisas", questionou-se e assimilou ou elaborou respostas que o satisfazem provisoriamente. Por causa disso, muitas vezes, o ensino choca-se de frente com as concepções dos aprendizes.
Nenhum professor experiente ignora este fato: os alunos pensam que sabem uma parte daquilo que se deseja ensinar-lhes. Uma boa pedagogia tradicional usa, às vezes, esses fragmentos de conhecimento como pontos de apoio, mas o professor transmite, pelo menos implicitamente, a seguinte mensagem: "Esqueçam o que vocês sabem, desconfiem do senso comum e do que lhes contaram e escutem-me, pois vou dizer-lhes como as coisas acontecem realmente".
A didática das ciências (Giordan e De Vecchi, 1987; De Vecchi, 1992, 1993; Astolfi e Develay, 1996; Astolfi, Darot, Ginsburger-Vogel e Toussaint, 1997; Joshua e Dupin, 1993) mostrou que não é possível livrar-se tão facilmente das concepções prévias dos aprendizes. Elas fazem parte de um sistema de representações que tem sua coerência e suas funções de explicação do mundo e que se reconstitui sub-repticiamente, a despeito das demonstrações irrefutáveis e dos desmentidos formais feitos pelo professor. Até mesmo ao final dos estudos científicos universitários, os estudantes retomam ao senso comum quando estão às voltas, fora do contexto da aula ou do laboratório. Tudo se passa como se o ensino teórico expulsasse, na hora da aula e do exame, uma "naturalidade" prestes a reaparecer a todo vapor nos outros contextos.
O que vale para as ciências manifesta-se em todas as áreas em que a ocasião e a necessidade de compreender não esperaram que o assunto fosse tratado na escola... Trabalhar a partir das representações dos alunos não consiste em fazê-Ias expressarem-se, para desvalorizá-Ias imediatamente. O importante é dar-Ihes regularmente direitos na aula, interessar-se por elas, tentar compreender suas raízes e sua forma de coerência, não se surpreender se elas surgirem novamente, quando as julgávamos ultrapassadas. Para isso, deve-se abrir um espaço de discussão, não censurar imediatamente as analogias falaciosas, as explicações animistas ou antropomórficas e os raciocínios espontâneos, sob pretexto de que levam a conclusões errôneas.
Bachelard (1996) observa que os professores têm dificuldades para compreender que seus alunos não compreendem, já que perderam a memória do caminho do conhecimento, dos obstáculos, das incertezas, dos atalhos, dos momentos de pânico intelectual ou de vazio. Para o professor, um número, uma subtração, uma fração são saberes adquiridos e banalizados, assim como o imperfeito, a noção de verbo, de concordância ou de subordinada ou, então, a noção de célula, de tensão elétrica ou de dilatação. O professor que trabalha a partir das representações dos alunos tenta reencontrar a memória do tempo em que ainda não sabia, colocar-se no lugar dos aprendizes, lembrar-se de que, se não compreendem, não é por falta de vontade, mas porque o que é evidente para o especialista parece opaco e arbitrário para os aprendizes. De nada adianta explicar cem vezes a técnica de desconto a um aluno que não compreende o princípio da numeração em diferentes bases. Para aceitar que um aluno não compreende o princípio de Arquimedes, deve-se avaliar sua extrema abstração, a dificuldade de conceituar a resistência da água ou de se desfazer da idéia intuitiva de que um corpo flutua "porque faz esforços para não afundar", como um ser vivo.
Para imaginar o conhecimento já construído na mente do aluno, e que obstaculiza o ensino, não basta que os professores tenham a memória de suas próprias aprendizagens. Uma cultura mais extensa em história e em filosofia das ciências poderia ajudá-los, por exemplo, a compreenderem por que a humanidade levou séculos para abandonar a idéia de que o Sol girava em torno da Terra, ou para aceitar que uma mesa seja um sólido essencialmente vazio, considerando-se a estrutura atômica da matéria. A maior parte dos conhecimentos científicos contraria a intuição. As representações e as concepções que lhes são opostas não são apenas aquelas das crianças, mas das sociedades do passado e de uma parte dos adultos contemporâneos. É igualmente útil que os professores tenham algumas noções de psicologia genética. Enfim, é importante que se confrontem com os limites de seus próprios conhecimentos e que (re)descubram que as noções de número imaginário, de quanta, de buraco negro, de supercondutor, de DNA, de inflação ou de metacognição colocam-no em dificuldades, da mesma forma que seus alunos, diante das noções mais elementares.
Resta trabalhar a partir das concepções dos alunos, dialogar com eles, fazer com que sejam avaliadas para aproximá-Ias dos conhecimentos científicos a serem ensinados. A competência do professor é, então, essencialmente didática. Ajuda-o a fundamentar-se nas representações prévias dos alunos, sem se fechar nelas, a encontrar um ponto de entrada em seu sistema cognitivo, uma maneira de desestabilizá-los apenas o suficiente para levá-los a restabelecerem o equilíbrio, incorporando novos elementos às representações existentes, reorganizando-as se necessário.

TRABALHAR A PARTIR DOS ERROS E DOS OBSTÁCULOS À APRENDIZAGEM

Esta competência segue imediatamente a anterior. Baseia-se no postulado simples de que aprender não é primeiramente memorizar, estocar informações, mas reestruturar seu sistema de compreensão de mundo. Tal reestruturação não acontece sem um importante trabalho cognitivo. Engajando-se nela, restabelece-se um equilíbrio rompido, dominando melhor a realidade de maneira simbólica e prática.
Por que a sombra de uma árvore se alonga? Porque o Sol se deslocou, dirão aqueles que, na vida cotidiana, continuam a pensar que o Sol gira em tomo da Terra. Porque a Terra seguiu sua rotação, dirão os discípulos de Galileu. Daí a estabelecer uma relação precisa entre a rotação da Terra (ou o movimento aparente do Sol) e o alongamento de uma sombra, há apenas um passo, que supõe um modelo geométrico e trigonométrico que a maioria dos adultos teria bastante dificuldade para relembrar ou elaborar rapidamente.
A pedagogia clássica trabalha a partir dos obstáculos, mas privilegia aqueles que a teoria propõe, aqueles que o aluno encontra em seu livro de matemática ou de física, quando, lendo pela terceira ou oitava vez o enunciado de um teorema ou de uma lei, ainda não compreende por que a soma dos ângulos de um triângulo é igual a 180°, ou como pode ser possível um corpo cair com aceleração constante.
Uma verdadeira situação-problema obriga a transpor um obstáculo graças a uma aprendizagem inédita, quer se trate de uma simples transferência, de uma generalização ou da construção de um conhecimento inteiramente novo. O obstáculo torna-se, então, o objetivo do momento, um objetivo-obstáculo, conforme a expressão de Martinand (1986) retomada por Meirieu, Astolfi e muitos outros.
Deparar-se com o obstáculo é, em um primeiro momento, enfrentar o vazio, a ausência de qualquer solução, até mesmo de qualquer pista ou método, sendo levado à impressão de que jamais se conseguirá alcançar soluções. Se ocorre a devolução do problema, ou seja, se os alunos apropriam-se dele, sua mente põe-se em movimento, constrói hipóteses, procede a explorações, propõe tentativas "para ver". Em um trabalho coletivo, inicia-se a discussão, o choque das representações obriga cada um a precisar seu pensamento e a levar em conta o dos outros.
É nesse momento que o erro de raciocínio e de estratégia ameaça.  
Diante de uma tarefa complexa, os obstáculos cognitivos são, em larga medida, constituídos por pistas falsas, erros de raciocínio, estimativa ou cálculo. Entretanto, o erro também ameaça aparecer nos exercícios mais clássicos.
A didática das disciplinas interessa-se cada vez mais pelos erros e tenta compreendê-los, antes de combatê-Ios. Astolfi (1997) propõe que se considere o erro como uma ferramenta para ensinar, um revelador dos mecanismos de pensamento do aprendiz. Para desenvolver essa competência, o professor deve, evidentemente, ter conhecimentos em didática e em psicologia cognitiva. De início, deve interessar-se pelos erros, aceitando-os como etapas estimáveis do esforço de compreender, esforçar-se, não corrigi-los ("Não diga, mas diga!"), proporcionando ao aprendiz, porém, os meios para tomar consciência deles, identificar sua origem e transpô-los.

CONSTRUIR E PLANEJAR DISPOSITIVOS E SEQÜÊNCIAS DIDÁTICAS

Uma situação de aprendizagem inscreve-se em um dispositivo que a torna possível e, às vezes, em uma seqüência didática na qual cada situação é uma etapa em uma progressão. Seqüências e dispositivos didáticos inscrevem-se, por sua vez, em um contrato pedagógico e didático, regras de funcionamento e instituições internas à classe.
As noções de dispositivo e de seqüência didáticos chamam a atenção para o fato de que uma situação de aprendizagem não ocorre ao acaso e é engendrada por um dispositivo que coloca os alunos diante de uma tarefa a ser realizada, um projeto a fazer, um problema a resolver. Não há dispositivo geral; tudo depende da disciplina, dos conteúdos específicos, do nível dos alunos, das opções do professor. Um procedimento de projeto leva a certos dispositivos. O trabalho por meio de situações-problema leva a outros, os procedimentos de pesquisa, a outros ainda. Nesses casos, há um certo número de parâmetros que devem ser dominados para que as aprendizagens almejadas se realizem.
Dispositivos e seqüências didáticas buscam, para fazer com que se aprenda, mobilizar os alunos seja para compreenderem, seja para terem êxito, se possível os dois (Piaget, 1974). Sua concepção e sua implantação levam ao confronto de um dos dilemas de toda pedagogia ativa: ou investir em projetos que envolvam e apaixonem os alunos, com o risco de que professores e alunos tornem-se prisioneiros de uma lógica de produção e de êxito, ou implantar dispositivos e seqüências mais abertamente centralizados em aprendizagens, reencontrando os impasses das pedagogias da lição e do exercício (Perrenoud, 1998n).
Todo dispositivo repousa sobre hipóteses relativas à aprendizagem e à relação com o saber, o projeto, a ação, a cooperação, o erro, a incerteza, o êxito e o fracasso, o obstáculo, o tempo. Se construímos dispositivos partindo do princípio de que todos querem aprender e aceitam pagar um preço por isso, marginalizamos os alunos para os quais o acesso ao saber não pode ser tão direto. Procedimentos de projeto podem, ao contrário, tornar-se fins em si mesmos e afastar-se do programa. A competência profissional consiste na busca de um amplo repertório de dispositivos e de seqüências na sua adaptação ou construção, bem como na identificação, com tanta perspicácia quanto possível, que eles mobilizam e ensinam.
Como tomar o conhecimento apaixonante por si mesmo? Essa não é somente uma questão de competência, mas de identidade e de projeto pessoal do professor. Infelizmente, nem todos os professores apaixonados dão-se o direito de partilhar sua paixão, nem todos os professores curiosos conseguem tornar seu amor pelo conhecimento inteligível e contagioso. A competência aqui visada passa pela arte de comunicar-se, seduzir, encorajar, mobilizar, envolvendo-se como pessoa.
A paixão pessoal não basta, se o professor não for capaz de estabelecer uma cumplicidade e uma solidariedade verossímeis na busca do conhecimento. Ele deve buscar com seus alunos, renunciando a defender a imagem do professor "que sabe tudo", aceitando mostrar suas próprias divagações e ignorâncias, não cedendo à tentação de interpretar a comédia do domínio, não colocando sempre o conhecimento ao lado da razão, da preparação do futuro e do êxito. Quanto aos professores que se mostram impassíveis diante dos conhecimentos que ensinam, como esperar que suscitem a menor vibração em seus alunos?
Todas as competências precisam ser evocadas, pois têm um forte componente didático. Esta última, mais do que as outras, lembra-nos que a didática tropeça incessantemente na questão do sentido e da subjetividade do professor e do aprendiz e, portanto, também nas relações intersubjetivas que se constituem acerca do saber, mas não se desenvolvem somente no registro cognitivo.
O sistema universitário francês compreende três ciclos: o primeiro corresponde à Graduação no Brasil, o segunda e o terceiro correspondem, aproximadamente, à pós-graduação (mestrado e doutorado).

BIBLIOGRAFIA RECOMENDADA:

PERRENOUD, Phillippe. As novas competências para ensinar. Porto Alegre: Artmed, 2004.





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