Blog EDUCAÇÃO BRASILEIRA CONTEMPORÂNEA, de autoria
de Álaze Gabriel.
Autoria:
Roberto Gerardo Bianchetti1. Professor de Política Educacional
da Universidade Nacional de Salta (UNSA), Salta, Argentina. Mestre em Educação
pela Universidade Federal Fluminense (UFF).
RESUMO
'Educação de qualidade' e 'qualidade da educação'
são termos repetidos nos documentos e discursos que acompanham as propostas de
ação no terreno educativo e que são utilizados para justificar determinadas
estratégias de políticas educativas. Este artigo busca explicitar estes conceitos,
considerando que os diferentes usos ou suas diferentes interpretações podem ser
conseqüência dos processos histórico-sociais que atravessaram os países nas
últimas décadas. O estudo afirma que o conceito de 'qualidade' converte-se num
dilema para a definição das políticas educacionais, já que pode ser utilizado
com sentidos e conteúdos muito diferentes, e, em alguns casos, antagônicos.
Reconhece também a existência de um conteúdo ideológico do conceito quando
vinculado à educação.
Palavras-chave: educação de qualidade; qualidade da educação;
estratégias políticas educacionais; educação e ideologia.
Dilema (do latim dilemma):
Argumento formado por duas proposições contrárias disjuntivamente, com tal
artifício que, negada ou concedida qualquer uma delas, fica demonstrado o que
se tenta provar. (Dicionário da Real Academia Espanhola).
APRESENTAÇÃO
Este trabalho2
tem como objetivo contribuir com algumas reflexões ao debate que se faz
necessário na comunidade educativa, ligado a um conceito que é utilizado no
discurso político para justificar determinadas estratégias de políticas
educativas.
'Educação de qualidade' e 'qualidade da educação'
são dois referentes repetidos nos documentos e discursos que acompanham as
propostas de ação no terreno educativo, mas que muitas vezes, como na imagem da
bíblica da Torre de Babel, não podemos entender a que aspectos das ações envolvidas
fazem referência.
Os diferentes usos ou suas diferentes
interpretações podem ser conseqüência dos processos histórico-sociais que
atravessaram os países nas últimas décadas. De forma esquemática é possível
dizer que a crise dos modelos de Estado Social foi usada pelas tendências
neoconservadoras para questionarem muitos dos seus princípios e valores,
fundamentalmente aqueles que se expressavam nas políticas sociais destinadas a
diminuir as desigualdades. As políticas neoliberais chegaram a revitalizar
princípios e pressupostos próprios do 'liberalismo conservador' nas áreas da
economia, da política e do pensamento social, no intuito de restaurar e
legitimar novas estruturas hierárquicas nas sociedades.
No final do século XX e nos primeiros anos do século
XXI se produz uma mudança na orientação ideológica de alguns dos governos
latino-americanos, que impulsionaram, com características e dinâmicas
diferentes, estratégias destinadas a superar os problemas econômicos, políticos
e sociais, gerados pela aplicação das políticas neoliberais.
Destes três momentos, o presente, caracterizado
como 'pós-neoliberal'3,
constitui uma etapa histórica de síntese e, como conseqüência, se superpõem
concepções, práticas sociais e transformações estruturais, que provêm de todas
essas experiências. Os processos sociais de cada país adquirem características
diferentes e distintos níveis e graus de complexidade, que são o reflexo das
políticas executadas na década de 1990.
Os novos programas políticos propõem, em geral, a
recuperação de formas solidárias de redistribuição, maior participação do
Estado na regulação da economia e das políticas sociais destinadas a recompor
os laços de solidariedade como resposta à fragmentação social herdada. O
discurso político que expõe estas propostas emprega conceitos que possuem, em
muitos casos, uma determinada carga semântica dada pela origem ou pelo uso mais
generalizado e, assim, a sua utilização pode prestar-se a confusões.
Michel Apple resume esta idéia quando diz que os
conceitos não duram em demasia. Têm asas, para dizer de alguma maneira, e podem
voar de um lugar para outro. Este é o contexto que define o seu significado.
Esta é a situação que se apresenta quando se faz
referência à 'qualidade da educação', já que existe unanimidade entre aqueles
que analisam as diferentes dimensões do fato educativo de reconhecer a
dificuldade para encontrar um acordo sobre o seu conteúdo.
Sverdlick (2001) aponta que Rocio Llerena, em seu
artigo A investigação educativa para a qualidade, comenta que, em uma
revisão da literatura ligada ao tema, encontram-se 950 referências nacionais e
internacionais sobre a qualidade da educação, dando a entender que é um
conceito que pode ser utilizado com múltiplos sentidos, inclusive em alguns
casos antagônicos, ou de forma imprecisa, ambígua, com o objetivo de obter
adesões quando isso pode ajudar a alcançar um determinado consenso.
Neste sentido, é necessário ter presente que o
conceito de 'qualidade' encontra-se instalado no 'senso comum', por estar
relacionado com diferentes experiências pessoais. Sua denominação invoca certas
qualidades de um objeto, situação ou experiência, que tenha sido avaliada por
cada um de nós, como conseqüência de uma circunstância vivenciada.
A 'boa ou má qualidade' de alguma coisa remete
geralmente a situações agradáveis - no primeiro caso - ou desagradáveis - no
segundo - e, portanto, a reação frente a essa palavra se encontra condicionada
por um sentimento que tem origem num juízo de valor.
O discurso político, que tem como objetivo
influenciar o coletivo social para instaurar, manter ou transformar uma
determinada ordem social, na exposição dos objetivos do programa faz uso de
referentes associados às experiências positivas daqueles a quem está dirigida a
proposta, em função da necessidade de somar adesões ou neutralizar
resistências.
Essa estratégia muitas vezes oculta as verdadeiras
intenções, e nesse sentido pode ser caracterizada como um discurso ideológico.
É por essa razão que, na análise das políticas sociais, coincidimos com a
opinião de que uma política educativa não é uma sucessão de atuações ou de
decisões desconexas, mas que se deve pressupor que umas e outras (ações) são
adotadas com a coerência de um programa político, pois o programa político
refere-se a valores e opções ideológicas concretas (Pedró e Puig, 1998).
Estas afirmações nos ajudam a formular a hipótese
de que a dificuldade para encontrar um sentido único que contenha as múltiplas
interpretações do conceito de 'qualidade' - quando se refere aos processos
envolvidos na educação - deve-se a que esse conceito tem uma origem e um
referente específico, associado a um modelo social, e que, como conseqüência,
cria confusões ou se ressente de precisão, ou de muitos esclarecimentos, quando
é utilizado para definir aspectos do processo educativo que não se ajustam aos
parâmetros do sentido originário.
Em outras palavras, a idéia de uma 'educação de
qualidade' encontra-se originariamente ligada a uma forma de conceber as
características e funções que a educação deve possuir e cumprir como ferramenta
de formação, para se adaptar às demandas requeridas para reproduzir e
potencializar um modelo de desenvolvimento capitalista.
Quando o projeto político se afasta dos valores e
princípios desse modelo de organização social, o conceito deixa de expressar o
sentido originário e se transforma num referente sem conteúdo específico e
passível de interpretações, confusões e manipulações. Uma proposta de educação
que não se limite a gerar processos de adaptação passiva à estrutura social,
mas que proponha formar para interagir 'em e com' o mundo e 'para' participar
dos projetos sociais inclusivos e solidários, não pode ser avaliada com os
mesmos critérios utilitaristas que servem para qualificar a qualidade nas
sociedades cujas relações sociais empregam a lógica da competência e a
sobrevivência do mais apto.
Neste caso e a partir dessa perspectiva é preciso
debater a possibilidade de promover um conteúdo de educação que possa ser
considerado como portador de um 'sentido e conteúdo' diferente, orientado a dar
resposta à necessidades mais urgentes e prioritárias de nossas sociedades.
QUALIDADE COMO INSUMO DA ECONOMIA
De acordo com o Dicionário da Real Academia
Espanhola, 'qualidade' significa 'propriedade ou conjunto de propriedades
inerentes a alguma coisa, que permite julgar seu valor'. Esta definição põe em
evidência a necessária relação que deve existir entre as propriedades de 'algo'
e os valores que estão associados a elas. Essa relação implica, em
conseqüência, considerar ambos os termos vinculados.
Na busca por alcançar maior precisão ou uma
determinada interpretação do conceito, as opiniões se abrem num amplo leque de
sentidos. Algumas delas nos ajudam a entender a busca.
Uma especialista em educação assinala a necessidade
de precisar o sentido e conteúdo atribuído às práticas envolvidas no processo
educativo, para poder compreender seus verdadeiros fins. Em suas palavras:
é possível afirmar que a
qualidade supõe uma valoração sobre as 'qualidades' daquilo ao que se aplica o
conceito... De modo que se vamos falar sobre a qualidade da educação, temos que
levar em conta que estamos implícita ou explicitamente propondo uma
caracterização da educação à qual nos referimos; às concepções que temos em
relação com a escola e suas funções; dos processos de ensino-aprendizagem; da
ação dos professores, dos processos de avaliação etc. (Sverdlick, 1997, p. 9).
Outro pesquisador destaca a utilização que se fez
destes conceitos na década de 1990 e que serviu para justificar ações que
associavam no discurso a experiências ou sentimentos positivos dos
destinatários. Em suas palavras,
A qualidade é seguramente um dos problemas mais
propagados nos anos 90. (...) Desta maneira, nos é oferecido como um grande
guarda-chuva protetor, carregado de promessas. A paixão pela qualidade, como
também o direito cidadão à qualidade, parece a conquista definitiva de um novo
estágio de desenvolvimento e progresso, ao que ninguém, por sua benevolência,
pode negar-se, ao que todos (não se deve esquecer que, na realidade, só alguns)
temos direito e possibilidade de realização (...) É muito mais simples em sua
contextura, gosta mais da lógica dos sentimentos e sensações, de estratégias e
procedimentos, mais de pragmática que de semântica, de formas e aparências como
substituição ou camuflagem de substâncias e realidades. Cuida com atenção dos slogans
e orientações para os cidadãos, sobretudo na sua condição de consumidores
(Escudero, 1999, p. 2).
Para concluir que:
(...) a qualidade dos anos 90
projeta seus raios de salvação sobre a educação. Naturalmente, também como
definitivos guarda-chuvas de garantia e promessas de melhor educação, uma
educação de qualidade (Escudero, 1999, p. 2).
Um terceiro analista acha necessário que as ações
de avaliação sobre as conquistas da educação devem surgir de um primeiro
acordo, aquele que se refere ao sentido que deve ser atribuído ao conceito de
qualidade, já que sua imprecisão pode torná-lo um 'sem sentido', pois cada um
pode lhe atribuir aquilo com o que se identificar melhor. Por esse motivo, ele
diz que
além dos exercícios de medição de qualidade
destinados a avaliar o porcentual de logro dos objetivos pedagógicos, está
pendente um acordo sobre o que se entende por qualidade da educação. De fato,
cada pessoa, pelo único fato de ter ido à escola, tem sua idéia a respeito. Com
maior razão, cada grupo de interesse tem uma idéia do que é uma educação de
qualidade relativa a suas posturas mais fundamentais (...) (Casassus, 2003, p.
65).
E destaca que:
(...) até um par de décadas
atrás, qualidade da educação era uma idéia alheia e até anacrônica para
o universo mental dos educadores. (...) em meados dos anos 80, a percepção
predominante era que uma pessoa tem uma melhor educação quando tem mais anos de
escolaridade (Casassus, 2003, p. 65).
Essas comparações quantitativas logo deram lugar às
medições qualitativas e como "resultado (...) tem terminado por fixar-se
em seu foco atual, qual é a observação e a medição do logro acadêmico"
(Casassus, 2003, p. 65).
Finalmente, uma tentativa de classificação do
conceito é proposta por uma pesquisadora, que cumpriu funções ministeriais e é
consultora internacional para organismos multilaterais (Banco Mundial,
Organização dos Estados Americanos, Unesco). Segundo ela, o conceito de
qualidade, quando referido à educação, é:
1 - Complexo e totalizante (...) permite ser
aplicado a qualquer um dos elementos, que entram no campo educativo.
2 - Social e historicamente determinado (...). É um
conceito socialmente determinado, que tem suas próprias definições e estas
definições surgem fundamentalmente das demandas que o sistema social faz
educação.
3 - É constituído em imagem-objetivo da
transformação educativa (...) é um conceito útil, já que permite definir a
imagem-objetivo do processo de transformação e, portanto, se constitui no eixo
que rege a tomada de decisões. A qualidade da educação é, de fato, o orientador
de qualquer transformação.
4 - É construído em um padrão de controle da
eficiência do serviço. (...) a qualidade da educação pode servir de padrão de
comparação para ajustar as decisões e reajustar processos (Aguerrondo, 1993).
E conclui que, "(se) há consistência entre o
projeto político geral vigente na sociedade e o projeto educativo que opera, é
essa relação a que define a existência da 'qualidade'" (Aguerrondo, 1993).
Esta última afirmação põe em destaque a necessária
relação que existe entre educação e política e, por esse motivo, pode-se
concluir que o conteúdo do conceito 'qualidade' está definido e determinado
pela orientação política.
Diante do que já foi dito, é possível observar
algumas das formas como este tema foi abordado. Essa circunstância nos habilita
a tentar realizar alguns aportes que contribuam com o debate.
Em primeiro lugar, compartilhamos com as afirmações
de que as decisões políticas que impulsionam estratégias, consideradas
necessárias para alcançar uma 'educação de qualidade', trazem sentidos
'implícitos' ou 'explícitos' como parte de um programa político concebido e
executado para concretizar um projeto social.
Neste sentido, a 'qualidade', considerada como um
'conjunto de propriedades' que são atribuídas ao que se quer designar com esse
conceito, encontra-se em relação com uma escala de valores que é própria da
filosofia que fundamenta toda proposta política e constitui um dos pontos de
partida desde onde vão ser estabelecidos objetivos e/ou prioridades políticas.
Em segundo lugar, a exigência de uma 'educação de
qualidade' por parte dos membros de uma sociedade vincula-se de forma direta à
experiências e expectativas daqueles que as possuem e consideram que, tendo
acesso a esta ferramenta, poderão obter certa vantagem para concretizar
determinados fins. Nesse caso, o sentido atribuído ao conceito de 'qualidade'
provém das necessidades e desejos, tanto dos sujeitos em forma individual
quanto dos diferentes grupos ou setores sociais. Dessa forma, nas últimas
décadas generalizou-se nos fóruns nacionais e internacionais o interesse pela
'qualidade' como um atributo necessário da educação para favorecer as
possibilidades de desenvolvimento econômico.
Algumas declarações e documentos deram ênfase ao
vínculo entre 'qualidade e eqüidade', sendo o primeiro conceito considerado
condição necessária para a realização do segundo. Esta associação entre dois
referentes que possuem, no imaginário social, uma carga valorativa positiva
aparece como uma tentativa de outorgar-lhe maior precisão.
Contudo, o conceito de 'eqüidade' apresenta as
mesmas dificuldades para atribuir-lhe um sentido inequívoco, já que sua
definição surge de uma oposição: "justiça natural em oposição lei positiva";
e num princípio distributivo: "dar a cada um o que merece".
Ambas as definições baseiam-se em juízos de valor
e, em conseqüência, as diferentes concepções políticas podem atribuir conteúdos
diferentes a essas afirmações. O que se entende por 'justiça natural'? É a que
os liberais aceitam? É a que os conservadores defendem? Quem, como e com que
critério se define o que 'cada ser humano merece'? Estas são algumas das
interrogações que surgem com essas afirmações. Portanto, tal relação, em vez de
precisar o conceito de qualidade, acrescenta confusão.
Fazendo um pouco de história, a vinculação entre
'educação e qualidade' adquire centralidade na análise e nas estratégias
políticas a partir dos resultados de um estudo sobre o desempenho dos
estudantes norte-americanos, considerando os resultados atingidos nos
diferentes níveis do sistema. Como assinala Casassus, "o interesse pela
qualidade da educação surgiu pela primeira vez nos Estados Unidos, em 1983, com
a publicação do Relatório da Comissão de Excelência em Educação (Nation at
Risk)" (Casassus, 2003, p. 63).
Este relatório4
destacava que, em termos relativos, ampliava-se a lacuna entre a formação que
os estudantes norte-americanos recebiam e a dos outros países com os quais
competiam, em termos econômicos e tecnológicos. As causas desse desequilíbrio
eram atribuídas, entre outras razões, à influência de teorias educativas
'progressistas' que tinham deslocado os conteúdos e métodos tradicionais na
educação, gerando a crise.
As conclusões do relatório foram usadas como
argumento por parte dos grupos políticos conservadores dos Estados Unidos para
reformular e reorientar os conteúdos da educação, como também a dinâmica e as
características dos modelos institucionais.
Essas idéias foram logo difundidas em muitos países
latino-americanos como filosofia implícita dos programas neoliberais que eram
financiados pelos organismos multilaterais (Torres, 1986).
Esse renascer das propostas conservadoras
revitalizou uma perspectiva de análise sociológica, que liga a economia à
educação, com a finalidade de medir sua incidência sobre o processo produtivo.
O 'funcionalismo' constitui, nas sociedades
capitalistas, uma das teorias que atingem maior influência na área dos estudos
sociais, logrando uma forte incidência nos níveis de elaboração das políticas
educacionais, prioritariamente nas áreas sócio-política, didática e de gestão.
Nesta teoria, duas orientações se destacam: o
"funcionalismo tecno-econômico", encarregado de analisar a relação
entre educação e desenvolvimento econômico, por mediação da tecnologia; e o
"funcionalismo meritocrático", que se centra na questão da 'igualdade
de oportunidades' de educação, e da incidência que produz, com a melhoria das
rendas individuais, o acesso aos diferentes níveis do sistema educativo (Gil
Villa, 1994, p. 50).
Como resultado destes estudos, atinge um alto nível
de desenvolvimento e expansão a denominada 'Teoria do Capital Humano', que se
sustenta sobre o princípio de que a educação constitui um investimento que as
pessoas fazem em si mesmas, para melhorar, no futuro, sua renda e suas
condições de vida.
Este princípio é utilizado em dois níveis da
análise econômica: um macro e outro micro. O primeiro estuda a incidência do
incremento dos custos públicos e privados em educação sobre a renda nacional. O
segundo analisa como a maior acumulação de anos de educação em nível individual
dará lugar a um incremento da produtividade futura do trabalhador e, portanto,
um aumento da sua renda (Gil Villa, 1994, p. 53).
Tais abordagens foram utilizadas por parte dos
pesquisadores dos governos e dos organismos internacionais com a finalidade de
avaliar a relação 'custo-beneficio', tanto em nível individual como em relação
aos índices que expressam o crescimento econômico.
Esta análise contém uma escala de valores que serve
para estabelecer prioridades na tomada de decisões de políticas educacionais e
são, além disso, as que outorgam o sentido originário do conceito 'qualidade'.
O desenvolvimento dos estudos que ligaram a
economia à educação tornou-se uma espécie de 'paradigma' empregado pelos
planejadores e executores de políticas educativas na elaboração de propostas. É
a partir daí que começa a considerar-se que a educação prepara os 'recursos
humanos' que vão ser demandados pelos processos produtivos. Ou seja, que para o
funcionalismo, a educação cumpre uma série de funções na sociedade, tanto em
relação ao subsistema cultural quanto ao político ou ao econômico, como são as
funções de socialização, de legitimação ou de seleção e classificação da
mão-de-obra (Guerrero Serón, 2003).
De acordo com esta perspectiva, a 'educação de
qualidade' consiste na formação certificada que oferece as ferramentas mais
eficientes para adquirir os conhecimentos, as atitudes e os valores exigidos
pelo sistema econômico, pelo regime político e pela convivência social numa
determinada sociedade. A educação de 'alta qualidade' é a que provê as
capacidades 'funcionais' para se chegar ao maior e melhor nível de
integração à sociedade, enquanto a 'baixa qualidade' é característica da
educação que não os contempla. As graduações entre um extremo e outro são
flexíveis e relativas.
A filosofia individualista é aquela que atribui
sentido a esta lógica de raciocínio, na medida em que parte do pressuposto de
que nas sociedades capitalistas é necessária uma 'competência de talentos' e
que é aí onde se produz a seleção natural que premia os que triunfam.
Na segunda metade do século XX, algumas das
conclusões do relatório Nation at Risk foram utilizadas pelo
conservadorismo político e social, para questionar os princípios e valores das
'teorias críticas' da educação, revalorizando os modelos educativos
tradicionais que aportam conteúdos pragmáticos e promovem a restauração dos
sistemas hierárquicos nas relações pedagógicas e na organização das
instituições.
A propagação dessas idéias ao restante dos países
acompanhou a estratégia do governo dos Estados Unidos, que reclamavam a
adequação dos 'estilos de desenvolvimento' dos países sob sua influência ou
domínio, para torná-los compatíveis com os seus interesses e necessidades de
potência hegemônica num mundo unipolar. O Tratado de Livre Comércio das
Américas é um exemplo.
Estes objetivos foram possíveis de se concretizar,
embora de forma parcial, em virtude do controle que esse país exerce sobre
alguns dos principais organismos multilaterais, assim como da cooptação de
intelectuais e políticos e do financiamento de reformas econômicas e/ou
políticas em alguns países, prioritariamente para os governos que aceitam
incorporar-se a essa nova divisão internacional do trabalho.
Nas últimas décadas, a teoria do 'capital humano',
como expressão da relação educação-economia, adquire novas características que
se adaptam à necessidades exigidas pela globalização econômica, apesar de
manter seus valores e princípios.
A esta lógica de raciocínio, baseado no cálculo
'custo-benefício' e 'inversão-produtividade', que dá o sentido originário da
teoria, acrescenta-se outra que avalia os resultados a partir da equação
'insumo-produto'.
Através desta relação, procura-se, no âmbito da
educação, conquistar mudanças na cultura institucional, nos valores que guiam
as práticas docentes, nas formas como os pais devem observar e avaliar as
instituições etc. Todas estas questões assumem como princípio a busca da
eficiência do investimento, que se consegue quando se produz um maior controle
sobre a produtividade. O termo accountability (que não tem tradução
direta nem para o espanhol nem para o português) é o conceito que expressa esta
tendência e o mesmo "faz referência (...) primeiramente aos resultados em
termos de aprendizagem e a utilização que os atores têm feito dos recursos para
alcançar esse objetivo" (Corvalán e McMeekin, 2006, p. 12).
De acordo com este raciocínio e a partir de duas
expressões utilizadas para a tradução -
'rendição de contas' e 'responsabilização' - ,
podemos ter uma aproximação à temática em questão, entendendo que a
accountability alude a ambos os sentidos: em parte é uma prestação de contas
aos interessados ou envolvidos pelos resultados do processo educativo, o que
por sua vez, se espera, tenha como conseqüência um incremento dos níveis de
responsabilização de cada ator sobre tal processo. (...) A prestação de contas
de contas na accountability educacional refere-se, então, primeiramente
aos resultados em termos de aprendizagem e à utilização dos recursos pelos
atores do processo para conseguir esse objetivo (Corvalán e McMeekin, 2006, p.
11-12)5.
Estas idéias, que foram introduzidas pela economia
na educação, incorporam um novo raciocínio à avaliação dos resultados dos
processos educativos e servem de argumento aos programas políticos que adotam a
'eficiência' como princípio que rege as políticas públicas.
Tendo como base estas premissas, os 'bons'
resultados da educação podem ser reconhecidos, por um lado, a partir de uma
equação que avalia os resultados em relação ao investimento realizado, na busca
por conseguir maior competitividade da economia e, por outro, quando os agentes
envolvidos (dirigentes e docentes) se responsabilizam pelas conquistas ou
fracassos dos alunos na aquisição das capacidades requeridas pelo modelo
social. O princípio da competência encontra-se implícito nesta proposta e, por
isso, as decisões políticas - quando estão regidas por esta lógica econômica -
assumem uma escala de valores baseada no cálculo que mede a relação
'custo-benefício', deslocando as perspectivas que possuem como referente
valores que qualificam as práticas sociais a partir de uma ótica solidária e
não mercantilizada.
Na década de 1990, na maioria dos países
latino-americanos, executaram-se políticas econômicas e sociais com um conteúdo
neoliberal. Em alguns deles, como Chile e Argentina, foram o fundamento das
reformas educativas. Nestes casos, a 'sociedade', como âmbito de expressão da
vontade e do interesse privado, deveria substituir o Estado em funções e
responsabilidades que historicamente haviam sido atribuídas e destinadas a este
último.
No contexto destas reformas, a 'qualidade da educação'
foi considerada como o resultado da competência de projetos
interinstitucionais, destinados a satisfazer as múltiplas demandas que cada
indivíduo reclama, de acordo com suas expectativas, necessidades e
possibilidades. Do acerto ou não dessa 'livre escolha' dependerão suas
possibilidades de sucesso em termos econômicos e sociais. A responsabilidade é
individual.
QUALIDADE, ENTRE O 'PÚBLICO' E O 'PRIVADO'
Na análise da questão da qualidade em educação, é
também necessário considerar que, na maioria dos sistemas educativos nacionais,
convivem dois âmbitos de domínio institucional: um público e estatal; o outro,
privado. As características e dimensões de cada um desses âmbitos refletem as
particularidades de seus processos históricos.
Nos momentos fundacionais dos estados nacionais, as
condições políticas exigiam controle estatal sobre a educação. Segundo uma
especialista,
os mesmos fundamentos teóricos do Estado Liberal,
ao romper com a sociedade estamental e proclamar a igualdade dos cidadãos,
deram base à concepção de um sistema escolar ao qual todos os cidadãos tinham
direito a aceder e cuja possibilidade estaria garantida pelo Estado, através da
organização de um sistema escolar público e universal (Ossenbach Sauter, 2002,
p. 35).
Esta necessidade política implicava, em alguns
países, uma contradição com alguns princípios do liberalismo, fundamentalmente
aqueles que negam ao Estado autoridade para intervir sobre as decisões que se
consideram próprias dos indivíduos, no seu âmbito privado. No entanto, frente
ao monopólio histórico da Igreja sobre a educação, a 'razão de Estado' antepôs
o interesse geral ao que podia ser considerado como o interesse de um setor da
sociedade.
Posteriormente a essas primeiras etapas, a
definição sobre o que é de responsabilidade ou de interesse público ou privado
foi sempre motivo de controvérsias, já que as questões envolvidas, assim como a
definição dos seus limites, constituem um elemento central da luta política6.
Por razões relacionadas com o controle social, e
levando em conta as funções que a educação cumpre em nossas sociedades, o poder
político precisa, para poder cumprir com seus objetivos, ter algum grau de
interferência em ambos os circuitos. No entanto, a sua maior responsabilidade é
a que se verifica através do sistema público estatal, quando é predominante.
Em outro sentido, as formas e características da
vinculação entre o poder público e os interesses dos grupos ou setores sociais
envolvidos com a educação privada estará determinada pelo grau de afinidade
entre os princípios e valores que sustentam ambos os setores.
No âmbito privado, os ideais de formação e as
características institucionais podem adquirir, geralmente, maior nível de
autonomia por serem instituições particulares que respondem a interesses
específicos. Educar num sistema de valores religiosos ou para inserir-se com
eficiência no mercado de trabalho ou, simplesmente, como investimento que
oferece bons lucros constituem (isoladamente ou de maneira convergente) os
objetivos dos modelos de instituições particulares, que existem na maioria dos
nossos países.
Os diferentes níveis do sistema educativo podem ser
motivo de particular interesse para aqueles que se propõem, em forma
prioritária, alcançar alguns dos objetivos mencionados e que avaliam que essa é
a forma de consegui-lo.
A seleção e integração do corpo docente, os
sistemas de ingresso dos estudantes, o valor das mensalidades; a organização e
os conteúdos do currículo, o regime disciplinar, o regime institucional etc.
evidenciam a filosofia que o projeto educativo possui, ainda que nem sempre os
reais interesses se manifestem de forma explícita.
A 'qualidade' é um dos termos mais utilizados pelo
privado para apresentar um modelo de educação à sociedade e essa denominação
encontra-se associada tanto ao 'senso comum' (ao que fizemos referência
anteriormente) como aos interesses sociais ou ideológicos dos que podem estar
interessados em optar por essas instituições.
As razões expostas nos permitem afirmar que, entre
os objetivos destes projetos educativos, é possível identificar aqueles
orientados a formar os 'intelectuais tradicionais', assim como os destinados a
gerar os 'intelectuais orgânicos', requeridos para a estabilidade e o
desenvolvimento do sistema social.
Nessas instituições, o apelo 'qualidade' apresenta
menos ambigüidade, já que a população que a exige é mais homogênea em termos
sociais ou ideológicos e, por isso, coincide tal projeto com as expectativas
dos que o procuram. Em alguns casos, a qualidade pode estar associada a
princípios e valores religiosos ('bom devoto'), a capacidades instrumentais
('eficiente trabalhador'), a uma expectativa de inserção social (empresário/
proprietário/pessoa destacada, profissionais) ou a uma livre combinação dos
mesmos.
O que aqui está expresso não significa desconhecer
a existência de instituições privadas, de orientação progressista, criadas a
partir de posições alternativas ao sistema oficial. Cooperativas, associações
comunitárias, sindicatos, entre outros, também oferecem propostas diferentes
das oficiais, ainda que a sua expansão seja menor, quando comparada a outros
tipos de instituições e, em geral, atendem a uma população mais heterogênea, em
termos sociais.
Em relação à 'educação pública', sua origem - como
já foi mencionado - respondeu a uma necessidade política e transformou-se em
uma conquista histórica do bem comum - (já que) contribui para criar esse bem
(Gimeno Sacristán, 2001).
Uma das diferenças quanto à educação privada é que
"o sistema público é governado por representantes do todo público e não
por pessoas particulares (como ocorre no privado). O público é o que diz
respeito à competência do governo ou dos governos quando há diferentes níveis
na administração centralizada" (Gimeno Sacristán, 2001, p. 18).
Gimeno Sacristán introduz outro elemento para o
debate, ao afirmar que
ensino público é mantido pelo Estado, mas não deve
ser um monopólio estatal, ainda quando o Estado tenha um papel muito importante
por desempenhar ao representar os interesses da sociedade no seu conjunto. A
instância do público se opõe tanto ao que é privado (não possível de ser
desfrutado por todos) como à apropriação que uma parte da sociedade pode fazer
dele, subtraindo-o da totalidade da sociedade (Gimeno Sacristán, 2001, p. 25).
Esta definição para o que é público como um
espaço não limitado à ações geradas a partir do Estado, no sentido estrito
(público = não estatal) possui duas variáveis de interpretação: a primeira, que
responde a uma visão ampliada do 'Estado' - como "sociedade política mais
sociedade civil" (Portelli, 1997); e a segunda, que inverte o sentido dado
na primeira, associando o 'público' a todas as relações que não pertencem ao
âmbito privado, ou seja, à maioria das relações que se estabelecem na sociedade
e que estão orientadas e definidas por um 'natural e espontâneo interesse
coletivo' que se articula e se regula pelo mesmo princípio que rege o
intercâmbio de bens no mercado.
A primeira interpretação serve para promover ações
que favoreçam a generalização e ampliação das práticas democráticas, enquanto
que a segunda, ao reduzir a diferença entre os âmbitos público e privado,
propõe ampliar a privatização7
do espaço social8.
A definição da 'qualidade da educação' para o
âmbito público, e considerando estas duas interpretações, põe em evidência a
confusão que é gerada.
Nessa disputa por lhe outorgar um conteúdo claro ao
conceito, Gimeno Sacristán reclama que, com relação à educação pública,
qualidade tem que ser uma característica essencial,
não permitindo que o debate em torno desta exigência seja monopolizado pelo
conservadorismo político, pelos enfoques empresariais da gestão ou pelos
tecnocratas assépticos, dando a sua peculiar versão sobre o que devemos
entender por qualidade (Gimeno Sacristán, 2001, p. 32).
Para este autor, as definições sobre o que se
entende por qualidade da educação permitiriam elaborar estratégias adequadas
para dar respostas à necessidades das maiorias sociais, já que é
responsabilidade do Estado o atendimento das necessidades do coletivo social.
Nos últimos anos, as referências a este tema
tomaram uma nova dimensão, constituindo-se em tema central dos debates nos
fóruns internacionais sobre educação.
QUALIDADE COMO PREOCUPAÇÃO NOS FÓRUNS
INTERNACIONAIS
A Conferência de Jomtien (Tailândia), em 1990, foi
um dos principais espaços de reunião entre governos, agências internacionais e
diferentes organizações não-governamentais relacionadas com a educação, para
definir linhas de ação e estabelecer compromissos para responder à urgentes
necessidades educativas de todos os países, mas, de forma prioritária, às dos
países de menor desenvolvimento econômico.
A qualidade transformou-se no tema central da
segunda reunião, realizada em Nova Déli, do Fórum Consultor Internacional sobre
Educação para Todos, que tinha sido criado na Conferência de Jomtien para fazer
um acompanhamento, nos diferentes países, dos programas postos em execução a
partir deste encontro.
Simultaneamente, e também no início da década de
1990, começam a acontecer reuniões de cúpula ibero-americanas de
chefes-de-estado e de governo, as quais tratam de temas cuja importância podem
demandar esforços comuns. Destas reuniões participam governantes dos países
latino-americanos, Espanha e Portugal.
Nas primeiras reuniões, realizadas no México e em
Madri, discutiram-se as metas que se pretendiam alcançar no decênio, tomando
como ponto de partida uma crítica às "mazelas que a região carrega"
(citação textual do documento). Como um dos temas importantes, houve consenso em
que a educação constará como um item específico dentro de um contexto, onde os
chefes de governo destacam também a inegável necessidade de incentivar o
desenvolvimento econômico e social e que todos os representantes se comprometem
a um profundo reajuste nas economias para alcançar a recuperação e o
crescimento com eficiência (Martinez Usarralde, 2005).
Na reunião de cúpula realizada em 1995 em São
Carlos de Bariloche (na Argentina), foi assinado um acordo onde os governos
devem ter como objetivos a democratização do ensino, a geração de condições de
qualidade na educação e a atenção exigida pelo princípio da eqüidade,
concedendo ao Estado, para tal fim, um papel estratégico (Martinez Usarralde,
2005).
Como resultado destas reuniões organizam-se as
conferências ibero-americanas de educação, promovidas pela Organização de
Estados Ibero-americanos para a Educação, a Ciência e a Cultura (OEI), das
quais participam ministros da área ou chefes de delegação. Nesses âmbitos, o
tema da qualidade volta a ser incorporado e o objetivo central é concretizar os
acordos alcançados nas conferências dos chefes-de-estado.
Cada uma das reuniões estabelecia um tema central
para ser debatido. No que se refere à 'qualidade da educação', a questão é
examinada pela primeira vez na V Conferência de Buenos Aires, em 1995. Nesta
oportunidade, o eixo definido é a busca de um compromisso com a qualidade e a
eqüidade, modernização das administrações, formação em valores e eqüidade para
um mundo em transformação.
Como se pode observar, a qualidade, nesta
oportunidade, está associada a mudanças ao nível das instituições educativas,
assim como aos valores exigidos por estas transformações. No caso da Argentina,
estas orientações apresentam-se no momento da instrumentação da Lei Federal de
Educação, que introduz modificações no Sistema Educativo, com uma clara
orientação neoliberal. Um exemplo disso é a caracterização da 'educação
pública' como âmbito único, tendo como conseqüência que a diferenciação entre
'público e privado' fica reduzida a uma questão de 'gestão'.
Tal questão volta a ser priorizada na Conferência
de Havana, em 1999, através do eixo 'Qualidade da Educação: qualidade,
desenvolvimento e integração frente ao desafio da globalização'. Nesse caso, a
qualidade está relacionada a uma perspectiva macro - 'a globalização' -
associada ao desenvolvimento e integração. A diferença de dimensão, com relação
ao proposto na conferência de Buenos Aires, é evidente.
Todas estas referências evidenciam, como e em que
momento começa a se instalar na agenda pública esta temática e isso confirma
que os problemas entram no discurso e, portanto, na existência, como reforço
das ideologias, não simplesmente porque estão aí ou porque são importantes para
o bem-estar (Edelman, 1991).
Esta definição ajuda a compreender que a 'qualidade
da educação' é uma preocupação política, surgida num momento da história de
nossas sociedades e prioritariamente associada a avaliações de resultados, no
campo do desenvolvimento econômico.
Se bem podemos observar que a questão foi tratada
em duas reuniões, na de Buenos Aires os debates eram orientados para definir
novos modelos institucionais e de gestão. Para a primeira reunião, foram
apresentados à sociedade os modelos de escolas charter e propostas de
financiamento através dos 'bônus educativos' ou de diferentes formas de
'autogestão'. Já no caso da Conferência de Havana, em Cuba, a 'globalização'
foi definida como um desafio, um desafio político para os países, e é de se
supor - estamos nos referindo a uma reunião que aconteceu em Cuba - que o
enfrentariam com um projeto político considerado conveniente.
Na Argentina e na maioria dos países da América
Latina, as propostas mencionadas foram impulsionadas e financiadas pelo Banco
Mundial, instituição comprometida com a estratégia dos Estados Unidos para
estabilizar um sistema unipolar. Entre os desafios com que, segundo esta
instituição, se deparavam os 'países em desenvolvimento', destacava-se a
qualidade vista como um problema generalizado que afeta a todo o mundo em
desenvolvimento (Coraggio e Torres, 1997).
No entanto, para a pesquisadora Rosa María Torres,
a qualidade educativa, na concepção do Banco Mundial, seria o resultado da
presença de determinados gastos que intervêm na escolaridade (Coraggio e
Torres, 1997). O elemento comum das propostas do Banco Mundial é o traço
economicista de seus programas que promoviam, entre outras políticas: limitação
da responsabilidade do Estado na sustentação do sistema educativo,
estabelecendo como prioridade o nível básico de formação; introdução dos
mecanismos de mercado nas relações entre os gastos que intervêm no processo
educativo, envolvendo a família no seu financiamento; a promoção dos valores
próprios do ideário neoliberal como modelo social etc.
Todas as propostas de mudança foram apresentadas
como estratégias inevitáveis para modernizar a sociedade e integrar-se à nova
ordem mun- dial. O 'desenvolvimento econômico' era considerado como a
conseqüência natural da aplicação de políticas destinadas a produzir mudanças
ao nível da economia, legislação social, relações do Estado com a sociedade
etc., mas, fundamentalmente, uma mudança nos princípios e valores sociais.
Estes modelos não contemplavam particularidades. Um
exemplo disso nos é oferecido por Rosa María Torres, quando conta a sua
experiência como assessora educativa da Unicef, por ocasião de uma viagem a um
'país caribenho'. O relato começa com estas palavras:
O ministro da educação deste país caribenho
aproxima-se de sua escrivaninha e, com grande satisfação, me entrega três volumes.
Diagnósticos, Recomendações e Plano, respectivamente, para a educação do seu
país nos próximos cinco anos. (...) Folheando somente o primeiro volume,
confirmo o que temia: trata-se do diagnóstico estandardizado em torno da
educação e sua problemática, o que se repete com assombrosa uniformidade (...)
nos países do chamado Terceiro Mundo e nos da América Latina e do Caribe em
particular (Torres, 2005, p. 37).
Quem faz o prólogo do livro do qual extraímos esta
citação destaca que uma das qualidades desta pesquisadora é a sua capacidade de
observação minuciosa que se reflete na descrição das características do país
que visitava e que permitem reconhecê-lo como um dos mais pobres e atrasados da
América Latina. Ao finalizar o capítulo, a pesquisadora conclui que
O ministro deste pequeno país caribenho pediu-me
opinião e eu, com toda a franqueza, a dou. Por mais que eu tenha procurado,
tratando de ler nas entrelinhas, entre os quadros apresentados, não encontrei
seu país nos relatórios. (...) O Diagnóstico, as Recomendações e o Plano
poderiam referir-se a praticamente qualquer país do planeta. Por trás da
linguagem fria e das cifras impessoais não há história, não se percebe uma
pitada de cultura, algo que permita, enfim, entender de que classe de país é esse,
por que e como chegou onde está, como é a sua gente, sua juventude, seus
professores... o que pensa o seu povo sobre a educação que tem e que classe de
educação gostaria de ter (Torres, 2005, p. 40).
Este relato torna claro como muitos dos programas e
propostas elaboradas a partir de diferentes organismos internacionais não têm o
objetivo de atender as necessidades específicas das sociedades onde se aplicam,
mas tão-somente correspondem ao interesse de gerar processos compatíveis com o
dos países que fixam as políticas desses organismos.
O expressado até aqui permite reconhecer a
existência de um conteúdo ideológico do conceito de 'qualidade', quando
vinculado com educação.
O próprio conceito de 'qualidade' converte-se num
dilema para a definição das políticas educacionais, já que pode ser utilizado
com sentidos e conteúdos tão diferentes que, em alguns casos, podem até chegar
a ser antagônicos.
Na sua origem e nas orientações dos programas de
instituições internacionais, como o Banco Mundial, e dos governos da maioria
dos países capitalistas desenvolvidos (que são também quem definem as políticas
desses organismos), a 'qualidade da educação' é medida pelo grau de integração
e adaptação à condições exigidas por esse modelo social, adaptada à condições
históricas existentes.
Este é o sentido originário do termo e a forma mais
generalizada de utilização, o que o transforma numa expressão ligada ao
pensamento hegemônico nas sociedades capitalistas.
É por isso que a proposta de uma 'educação de
qualidade' converte-se num elemento vinculado de forma direta à práticas e à
condições de existência de certos grupos ou classes sociais, no entanto
converte-se num referente ambíguo, impreciso e confuso quando aparece vinculado
com a educação que é oferecida às maiorias sociais.
De acordo com o exposto, surge uma interrogação que
nos põe diante de uma disjuntiva: é possível empregar o conceito 'qualidade da
educação' para definir os objetivos de um projeto ou programa educacional que
se proponha concretizar uma alternativa libertadora frente à alienação da qual
a sociedade capitalista é portadora? Uma educação que contribua para a formação
de um sujeito social, que permita orientar seus pensamentos e ações para
construir uma sociedade distinta em valores e objetivos, com relação aos da
sociedade capitalista, pode ser qualificada como uma 'educação de qualidade'?
EDUCAÇÃO COM SENTIDO E CONTEÚDO
Boaventura dos Santos sustenta que:
os instrumentos hegemônicos que
temos são as semânticas legítimas da convivência política e social. (...)
[Isto] é um problema complicado porque se são instrumentos hegemônicos, por
definição não vão resolver nossas inquietações, nossas aspirações e não vão
conseguir o que desejamos, que é uma sociedade mais justa, reinventar a
emancipação social (Souza Santos, 2006, p. 72).
A partir deste ponto de vista, a confusão gerada
pelo conceito de qualidade da educação está instalada na sociedade. Pelo
exposto até aqui, vemos que se pode fazer referência a esta idéia partindo de
posições políticas e ideológicas distantes entre si. O Banco Mundial promove
mudanças nos sistemas educativos com o suposto fim de melhorar a qualidade; a
Unesco organiza fóruns e programas de acompanhamento dos acordos
intergovernamentais sobre a qualidade da educação. Nas últimas reuniões de
cúpula de governantes e nas conferências ibero-americanas de educação, governos
de países com condições e projetos político-sociais muito diferentes
referiram-se à importância de uma educação de qualidade.
No entanto, não é possível afirmar que essas
referências tenham muitos pontos em comum ou que exista total coincidência
sobre o conteúdo dado a este conceito; ao contrário, as diferenças existentes
nos projetos políticos e modelos sociais dos países envolvidos permitem deduzir
que cada um deles interpreta, desde a sua própria ótica e em função de seus
próprios interesses e necessidades, a idéia de uma educação de qualidade.
Sendo assim, pode-se entender a idéia de qualidade
da educação como um conceito que expresse um interesse comum de todas as
sociedades? Ou será que a pergunta deveria ser: qual é o interesse político
pela generalização desse conceito? A quem favorece a confusão que se gera a
partir desta formulação?
Talvez tenha chegado o momento de começarmos a
pensar em utilizar outros conceitos para nos referirmos quelas propostas de
política educacional que tenham como objetivo promover uma educação que
considere o ser humano como uma totalidade que deve interagir com a sociedade
de forma consciente, e não como quem é chamado a concretizar um legado natural.
Em busca de um discurso alternativo, podemos pensar
na idéia de uma educação que seja portadora de 'sentido' e 'conteúdo'.
Esta qualificação da educação supõe a necessidade
de desenvolver, nos seres humanos, as duas dimensões requeridas para assumir
uma atitude participante e crítica na sociedade.
Uma educação com 'sentido' pode ser definida como
aquela que contribui para o desenvolvimento de capacidades que permitem ao
sujeito compreender os processos sociais como materialização das ações humanas,
assim como o conhecimento das formas como são geradas as riquezas e os
diferentes mecanismos que podem ser adotados para a sua distribuição.
Além disso, tal proposta de educação supõe o
desenvolvimento de capacidades que permitam diferenciar as virtudes, defeitos e
potencialidades da democracia, para favorecer uma convivência inclusiva fundada
em valores que recuperem uma perspectiva integral, uma 'ecologia de saberes'9;
a compreensão da importância de generalizar os conhecimentos científicos para
conseguir melhorar as condições de vida na sociedade e o reconhecimento da
cultura como resultado das práticas sociais através da sua própria história.
Uma educação com 'conteúdo' define-se como aquela
que pode brindar uma formação adequada para atuar sobre a própria realidade
social, mas não como um sujeito sobredeterminado por alguma razão genética,
cultural ou metafísica, e sim um sujeito histórico que pode formar-se para o
trabalho, e não somente para o emprego, que pode conhecer e desenvolver a
ciência para utilizá-la em benefício da sociedade; em outras palavras, os
conhecimentos que permitem atuar sobre a realidade social, na perspectiva de
implicar-se com a construção de uma sociedade mais justa.
Estes conceitos, associados à educação, pretendem
assinalar uma diferença entre uma idéia que se baseia na relação entre
'custo-benefício', 'insumo-produto', 'utilidade-inutilidade', 'lucros-perdas' e
a outra, que toma como ponto de partida o reconhecimento do ser humano de forma
integral a partir do desenvolvimento de todas as capacidades e não somente
daquelas que são necessárias para a reprodução e permanência (continuidade) de
uma determinada ordem social capitalista.
Uma educação com 'sentido e conteúdo' pode
constituir-se numa alternativa idéia de uma 'educação de qualidade', enquanto
esta última possui um maior vínculo com as teorias educacionais que relacionam,
de maneira prioritária, a educação com a economia, como uma das funções
necessárias para abastecer de elementos requeridos ou demandados pela economia
capitalista.
Não é possível fazer referência a uma 'educação de
qualidade' se o modelo de homem que se pretende formar não possui as 'virtudes'
que lhe demanda um modelo social baseado na competição e na luta pela
apropriação ilimitada de bens materiais. Dessa forma, a idéia de uma 'educação
de qualidade' não pode ser separada da concepção e do modelo de
'desenvolvimento', numa sociedade capitalista.
É possível interpretar que quando um governo propõe
uma 'educação de qualidade' está fazendo referência a conteúdos destinados a
formar sob valores que dêem prioridade ao 'ser' sobre o 'ter'? Que concebem as
formas de produção protegendo os seus atores e o meio ambiente? Que reconheçam
o ser humano como uma realidade heterogênea nas suas características físicas e
culturais, mas com capacidades que permitem a convivência, isto é, todos
aqueles objetivos afastados de uma filosofia que confere sentido e valor de
mercadoria a tudo?
É provável que nos níveis de decisão política de
nossas sociedades seja necessário manter o conceito de uma 'educação de
qualidade' para continuar relacionando-se com os organismos internacionais ou
concorrer aos fóruns onde são analisadas estas questões, assim como para dar
legalidade às ações desenvolvidas no sistema de educação privada onde os que
definem a orientação, sentido e conteúdo do conceito de 'qualidade' das suas
propostas educativas são os mesmos proprietários de tais instituições privadas,
de acordo com os interesses econômicos ou ideológicos próprios ou uma
combinação de ambos.
Nas atuais condições econômico-sociais dos nossos
países, o sistema público de ensino sempre vai estar em desvantagem em relação
ao sistema privado enquanto se proponha utilizar a 'qualidade' no sentido que é
dado pela proposta competitiva para inserir-se no mercado. As exceções que
possam existir (colégios públicos de 'qualidade') só servem para confirmar a
regra.
A possibilidade de elaborar uma política
educacional alternativa perspectiva economicista deve começar por
diferenciar-se nos seus objetivos de formação, e essa diferenciação deve
expressar-se ao nível do próprio discurso.
Uma educação que forme para a mudança social não
pode ser medida como sendo de 'boa ou má qualidade', já que a sua função
não está orientada a uma mera adaptação das condições sociais existentes, mas
sim busca permanente de melhoria das condições de vida da sociedade.
A MODO DE CONCLUSÃO, AINDA QUE SEM PRETENDER
CONCLUIR
Segundo Tenti Fanfani (2008), a escola tem como
objetivo influir na formação das subjetividades das novas gerações e, deste
modo, prepará-las para integrar-se sociedade no seu conjunto.
O dilema é, então, perguntar-se: quais são as
subjetividades que se devem formar? De que maneira considera-se que estas novas
gerações devem estar integradas à sociedade?
As respostas a estas interrogações supõem decisões
no nível das políticas educativas e podem derivar de pelo menos duas matrizes teóricas:
a que concebe a integração como processo destinado a manter e reproduzir as
condições sociais existentes, a partir da idéia de os homens adquirirem
conhecimentos e habilidades úteis para interagir com a sociedade, tornando-os
mais eficientes no mundo do trabalho, no uso das novas tecnologias e nas
atividades relacionadas com a legitimação da ordem política. Em outras
palavras, incorporar-se à vida social, naturalizando os processos
histórico-sociais a partir de uma perspectiva que se adapte ordem social
existente.
A outra matriz teórica é qualitativamente
diferente, já que entende a integração como um processo de aquisição de saberes
e habilidades para conhecer, compreender e interpretar a realidade social como
resultado de um desenvolvimento histórico em que os próprios sujeitos são
responsáveis pela ordem social. Nesse sentido, a integração não é uma ação
meramente adaptativa, mas sim supõe situar-se em e com o mundo, incorporando os
saberes necessários para poder conceber e construir relações sociais
solidárias.
Ainda de acordo com Tenti Fanfani (2008), na - cada
vez mais - complexa realidade social, os agentes escolares devem ter um olhar
mais atento e fino do que sucede na sociedade. O conhecimento da estrutura e da
lógica de desenvolvimento das principais dimensões da vida social é cada vez
mais necessário, tanto para fazer política educativa como para exercer a ação
pedagógica nas instituições e nas salas de aula.
No discurso político que predomina na maioria dos
centros acadêmicos dos países capitalistas desenvolvidos, assim como nos
conteúdos de muitos dos programas de organismos internacionais que promovem
mudanças nos sistemas educativos nacionais, as denominações de uma 'educação de
qualidade' estão mais relacionadas com a primeira perspectiva, já que foi nesse
contexto onde surgiu e se constituiu o princípio que, de maneira explícita ou
implícita, serviu de fundamento aos programas de organismos internacionais e
serviu à políticas executivas nos países subdesenvolvidos na década de 1990.
Reformas curriculares, modelos institucionais,
conteúdos para a formação docente, legislação trabalhista foram alguns dos
âmbitos onde se impôs esta filosofia.
Uma perspectiva crítica das condições sociais
existentes e realizadas a partir de uma proposta de educação alternativa não
pode ser avaliada como de 'boa ou má qualidade' porque, na realidade, constitui
uma necessidade histórica e social de nossas sociedades para romper com o
colonialismo cultural e a histórica submissão aos 'paradigmas' elaborados que justificam
modelos sociais que mantêm a desigualdade.
Faz-se necessário recuperar o legado das correntes
sociais críticas, para poder recriar uma pedagogia que sirva para nos
identificar como sociedades, nas quais ainda não alcançamos completar nossos
projetos emancipatórios. É necessário recuperar as idéias de pensadores como
Paulo Freire, que desnudou, faz já muitas décadas, os verdadeiros sentidos das
práticas pedagógicas 'bancárias' que estavam destinadas a promover atitudes de
mera adaptação ou 'integração'.
Uma educação que pretenda converter-se numa
'prática da liberdade' não é de 'boa ou má qualidade'; é, sim, o imperativo que
os setores populares reclamam, principalmente os postergados, submetidos,
marginalizados, excluídos, que estão nessa situação porque muitos dos que
marginalizam, excluem ou submetem, receberam uma 'educação de qualidade'.
NOTAS
1
Professor de Política Educacional da Universidade Nacional de Salta (UNSA),
Salta, Argentina. Mestre em Educação pela Universidade Federal Fluminense
(UFF). <gerbian@unsa.edu.ar>
2
Texto, originalmente em espanhol, da conferência proferida no II Simpósio
Internacional e V Fórum Nacional de Educação, realizado em maio de 2008, na
Universidade Luterana do Brasil (Ulbra), Torres, Rio Grande do Sul, Brasil.
Tradução de Geruza Queiroz Coutinho, da Universidade Nacional de Salta.
3
Definir como 'pós-neoliberal' a etapa histórica atual não implica afirmar que
as políticas econômicas e sociais, derivadas dessas teorias, tenham sido
superadas pelos governos atuais. Em alguns casos, ainda têm vigência plena. O
conceito pretende fazer referência perda da dinâmica que o neoliberalismo tem
atualmente, comparado com a etapa na qual era definido como o 'pensamento
único'.
4
"A comissão tinha os seguintes objetivos: 1) avaliar a qualidade do
processo de ensino-aprendizagem nas escolas particulares e públicas, colleges
e universidades; 2) comparar as escolas e colleges norte-americanos com
outros de nações industriais mais avançados; 3) estudar as vinculações
existentes entre as exigências para a admissão dos estudantes de High School
e universidades e o desempenho acadêmico de quem se forma; 4) identificar
programas educativos que tenham resultados exitosos notáveis em nível acadêmico
e dos colleges; 5) avaliar o grau no qual as principais mudanças sociais
e educativas do último quarto de século tem afetado o desempenho acadêmico dos
estudantes e, finalmente, 6) definir os problemas a serem enfrentados e
superados na busca da excelência da educação" (Torres, 1986).
5
"O termo provém da esfera financeira e descreve a responsabilidade das
pessoas à quais o dinheiro é confiado. Isto significa informar sobre todo o
desembolso de fundos, uma prestação de contas de como esses fundos foram
utilizados e o que se fez com eles" (McMeekin, 2006, p. 20).
6
Na Argentina, a Lei Federal de Educação de 1993 anulou a diferença entre
sistema público e sistema privado, limitando-a a uma diferença de gestão.
7
"A institucionalização de práticas políticas que apagam as diferenças
entre esfera pública e esfera privada, limitando as discrepâncias à esfera
privada para construir o consenso na esfera pública, dissolve a dimensão do
político e oferece a imagem de uma sociedade isenta na qual desaparecem
(ocultam-se) o conflito, a repressão, o poder e a violência. Interrompe uma
concepção da política como eixo de transformações sociais, incorporando uma racionalidade
técnica que só se expressa no plano institucional, onde prevalece a
neutralidade valorativa e a eficiência das conseqüências" (Almandoz,
2005).
8
Como modelos institucionais que expressam estas tendências em educação, pode-se
mencionar a escola cidadã em Porto Alegre ou as escolas charter no
Chile.
9
"(...) a ciência moderna desenvolveu-se totalmente no âmbito do
'conhecimento-regulação' (CR) que recodificou, canibalizou, perverteu as
possibilidades do 'conhecimento-emancipação' (CE). E é por isso que o CE tem que
ser uma ecologia de saberes, não podendo ser simplesmente o saber moderno,
científico que temos, este é importante mas tem que estar incluído numa
ecologia de saberes mais ampla" (Souza Santos, 2006, p. 45).
REFERÊNCIAS
ALMANDOZ, María Rosa. Las lógicas de las decisiones
políticas en educación. In: FRIGERIO, Graciela, DICKER; Gabriela (Orgs.). Educar:
ese acto político. Buenos Aires: Del Estante Editorial, 2005.
AGUERRONDO, Inés. La calidad de la educación: Ejes
para su definición y evaluación. La educación. Revista Interamericana de
Desarrollo Educativo, n. 116. Washington D.C.: Organização dos Estados
Americanos (OEA). 1993. Disponível em <www.oei.es/calidad2/aguerrondo.htm>. Acesso em: 1 maio 2008.
CASASSUS, Juan. La escuela y la (des)igualdad.
Santiago: LOM Ediciones, 2003.
CORAGGIO, José Luis; TORRES, Rosa María. La
Educación según el Banco Mundial. Buenos Aires: Miño y Dávila, 1997.
CORVALÁN, Javier; MCMEEKIN, Robert W. (Eds.). Accountability
educacional: posibilidades y desafíos para América Latina a partir de la
experiencia internacional. Santiago: Cide-Preal, 2006.
DICIONÁRIO DA REAL ACADEMIA ESPANHOLA. Versão
online. Disponível em: <http://buscon.rae.es/draeI>. Acesso em: 1 maio 2008.
EDELMAN, Murray. La construcción del Espectáculo
Político. Buenos Aires: Manantial, 1991.
ESCUDERO, Juan Manuel. Calidad de la educación
entre la seducción y las sospechas. Heuresis, v. 2, n. 5, 1999.
Disponível em: <www2.uca.es/HEURESIS/heuresis99/v2.html>. Acesso em: 1 maio 2008.
FELDFEBER, Myriam; SAFORCADA, Fernanda. La
Educación en las cumbres de las Américas. Buenos Aires: Miño y Dávila, 2005.
GIL VILLA, Fernando. Teoría Sociológica de la
Educación. Salamanca: Amarú Ediciones, 1994.
GUERRERO SERÓN, Antonio. Enseñanza y sociedad.
Madri: Siglo XXI, 2003.
GIMENO SACRISTÁN, José. Los retos de la
enseñanza pública. Madri: Ediciones Akal, 2001.
MARTINEZ USARRALDE, Maria Jesus. La educación en
América Latina: entre la calidad y la equidad. Barcelona: Octaedro, 2005.
MCMEEKIN, Robert W. Hacia una comprensión de la accountability
educativa y cómo puede aplicarse en los países de América Latina. In: CORVALÁN,
Javier; MCMEEKIN, Robert W. (Eds.). Accountability educacional:
posibilidades y desafíos para América Latina a partir de la experiencia
internacional. Santiago: Cide-Preal, 2006, p. 19-49.
OSSENBACH SAUTER, Gabriela. Génesis de los sistemas
educativos nacionales en el mundo occidental. In: ______; TIANA FERRER,
Alejandro; SANZ FERNÁNDEZ, Florentino. Historia de la Educación (Edad
Contemporánea). Madri: Uned, 2005, p. 21-43.
PEDRÓ, Francesc; PUIG, Irene. Las reformas
educativas. Barcelona: Paidós, 1998.
PORTELLI, Hugues. Gramsci y el bloque histórico.
México D.F.: Siglo XXI, 1997.
SOUZA SANTOS, Boaventura de. Renovar la teoría
crítica y reinventar la emancipación social. Buenos Aires: Clacso, 2006.
SVERDLICK, Ingrid. Buscando la calidad educativa. Crítica
Educativa, ano 11, n. 2. Buenos Aires, 1997.
______. La evaluación universitaria. La calidad
como asunto político. Revista Páginas del área educación, n. 2.
Universidade Católica do Uruguai, 2001.
TENTI FANFANI, Emilio (Org.). Nuevos temas en la
agenda de Política Educativa. Buenos Aires: IIPE/Siglo XXI, 2008.
TORRES, Carlos Alberto. Nation at Risk. La
educación neoconservadora. In: Nueva Sociedad, n. 84. Venezuela, 1986.
TORRES, Rosa María. Itinerarios por la educación
latinoamericana: cuaderno de viajes. Buenos Aires: Paidós, 2005.